As recomendações alimentares tradicionais estão equivocadas!

As recomendações oficiais do Ministério da Agricultura sobre alimentação podem ser encontradas em um documento chamado Guia Alimentar para a População Brasileira - Promovendo a Saúde Nele é possível encontrar um série de diretrizes, abaixo segue um resumo dessas diretrizes.

Diretriz 1 - Alimentos saudáveis
  • Realizar pelo menos três refeições intercalas com lanches por dia.
  • 55-75% das calorias ingeridas diariamente devem vir de alimentos como cereais integrais, frutas, legumes e leguminosas (feijão).
Diretriz 2  - Cereais, tubérculos e raízes
  • Os alimentos com cereais, tubérculos e raízes devem representar 45-65% das colorias ingeridas diariamente.
  • Devem ser consumidas pelo menos 6 porções diárias de cereais, tubérculos e raízes.
Diretriz 3 - Frutas, legumes e verduras
  • Deve ser consumido cerca de 400 gramas (cerca de 10% das calorias diárias) de frutas, legumes e verduras.
  • Consumir pelo menos três porções diárias de frutas.
  • Consumir pelo menos três porções diárias de legumes e verduras.
Diretriz 4 - Feijões e outros alimentos vegetais ricos em proteínas
  • Consumir diariamente uma porção de leguminosas (feijões).
  • Consumir diariamente uma porção de feijão com arroz, na proporção de 1 para 2 partes.
  • Alimentos como soja, feijões, lentilhas, grão-de-bico, entre outros devem compor 5% das caloiras diárias.
Diretriz 5 - Leite e derivados, ovos e carne
  • Consumir três porções diárias de leite e derivados.
  • Consumo diário de um porção de carne, peixe, ou ovos.
  • Escolha produtos com menor teor de gordura.
Diretriz 6 - Gorduras, açúcar e sal
  • Reduzir o consumo de alimentos com alto teor de gorduras, sal e açúcar.
  • As gorduras e óleos não devem representar mais do que 15-30% das calorias diárias totais.
  • As gorduras saturadas não devem representar mais do que 10% das calorias diárias totais.
  • Consumir no máximo uma porção de alimentos do grupo das gorduras e óleos.
  • Consumir no máximo uma porção de alimentos do grupo dos açúcares e doces.
  • Consumir no máximo 5 mg (uma colher rasa de chá) de sal por dia.
Diretriz 7 - Água
  • Devem ser consumidos de 6-8 copos de água diariamente, independente de outros líquidos.
Considerando uma abordagem evolutiva estas recomendações me levam a seguinte questão: Este guia do Ministério da Saúde recomenda aquilo que é mais importante para que tenhamos saúde durante o transcorrer de nossa vida, certo? Bem se isso é o melhor para nossa saúde, como nosso ancestral caçador coletor (ACC) conseguiu sobreviver cerca 390 mil anos sem seguir a maioria dessas recomendações e sem uma série de alimentos (Trigo, pães, massas e cereais) que são considerados vitais? 

Bem vamos começar a tentativa de responder essa questão descobrindo qual era o percentual de CHO na dieta do nosso ACC. Essa resposta pode ser difícil já que não temos uma máquina do tempo para regressar cerca de 300 mil anos e fazer essa quantificação. 

Porém  um trabalho[1] avaliou o percentual dos macronutrientes da dieta de 229 sociedades atuais que vivem em condições semelhantes a do nosso ACC (metodologia de trabalho é reconhecida por antropologistas e nutricionistas) concluiu que  a contribuição dos alimentos de origem animal varia entre 45-65%. 73% das sociedades avaliadas tinham uma contribuição alimentos de origem animal maior do que 50%, enquanto somente 14% tinham uma contribuição dos alimentos de origem animal menor do que 50%. Aquelas sociedades que tinham uma contribuição dos alimentos vegetais maior do que 50% o faziam através de alimentos como raízes, tubérculos, sementes e castanhas, essas comunidades não consomem cerais, pães e massas.

O ACC tinha a sua disposição alimentos como insetos, peixes e outros animais marinhos, mamíferos terrestres, ovos, vegetais, frutas selvagens, raízes, tubérculos, castanhas, sementes e ocasionalmente mel.  Porém derivados do leite, grãos, legumes, açúcar, álcool e sal refinado eram indisponíveis [2].

Então! Podemos dizer que nosso ACC e as muitas sociedades atuais (com hábitos primitivos) não seguem a recomendação da Diretriz 2 do  Guia Alimentar para a População Brasileira - Promovendo a Saúde do Ministério de Saúde, será que a saúde pode ser comprometida com uma dieta diferente da recomendada pelas nossas autoridades?

No ano de 2011 foi publicado um trabalho (2) sobre estilo de vida e as doenças das sociedades ocidentais modernas. Nesse trabalho podemos encontrar as caraterísticas das sociedades de caçadores coletores que demonstram melhores indicadores de saúde do que as sociedades industrializadas, são elas:
  1. A pressão arterial é menor que os valores considerados normais (<120mmhg/80mmhg).
  2. Sem associação da pressão arterial com a idade, ou seja pessoas mais velhas não apresentam aumentos da pressão arterial.
  3. Mesmo com o avançar da idade persiste uma excelente sensibilidade a insulina, o que diminui o risco de diabetes do tipo 2 e outros problemas com a saúde.
  4. IMC (índice de massa corporal) menor do que 22kg/m2 (normal entre 18,5 e 24,9).
  5. Menor circunferência da cintura (medida de risco cardíaco e diabetes)
  6. Menor quantidade de gordura subcutânea.
  7. Maior capacidade cardiorrespiratória.
  8. Menor Incidência de fraturas ósseas.
Outros dois trabalhos [3,4] realizados com sociedades com estilo de vida primitivo demonstraram resultados semelhantes.

Considerando estes argumentos podemos concluir que é possível aos seres humanos viverem com uma quantidade de CHO muito menor do que as recomendações oficiais indicam.

Quais as justificativas para essa recomendação oficial sobre a ingestão de carboidratos? 
Do texto oficial extrai uma delas, para comentar.

"...além da presença de carboidratos complexos, nutrientes importantes para uma alimentação saudável é composta por proteínas e vitaminas do complexo B e outras vitaminas, minerais, ácidos graxos essenciais e fibras alimentares. Por exemplo, uma alimentação rica em ácido fólico, ou vitamina B9, protege a integridade do tubo neural durante o seu desenvolvimento nos primeiros meses de vida intra-uterina, evitando má formação da medula espinhal da criança e anencefalia..."

Vamos "olhar" mais profundamente essa justificativa!
Vitaminas do complexo B são realmente importantes para saúde, o que é curioso é que se consultarmos o TACO (Tabela Brasileira de Composição dos Alimentos) feita pela UNICAMP e analisarmos a quantidade de vitaminas do complexo B (Tianina [B1]; riboflavina [B]; Piridoxina [B6]; Niacina [B3]) existentes em 100 gramas de pão de trigo integral e 100 gramas de costela assada veremos o seguinte:

Vemos então que o total de vitaminas do complexo B do pão integral é de 0,27 mg enquanto na costela temos 0,99 mg, ou seja, 3 vezes mais. Analisando esses dados parece que se comermos 100 gramas de carne iremos ingerir mais vitaminas do complexo B do que se comermos 100 gramas de pão integral. Mas Carlinhos e o gordura saturada da carne? Falaremos disso mais tarde.

Uma outra questão importante é: Existem problemas para a saúde se comermos muito CHO? Para essa resposta vamos iniciar falando sobre a Insulina, Esse hormônio secretado pelas células beta do pâncreas que tem funções(5) como:
  • Regular a entrada de glicose (açúcar) em todas as células, principalmente nas musculares e adiposas.
  • Efeito pronunciado sobre a síntese (formação) de gordura corporal, pois possibilita a captação de glicose pelas células de gordura e a formação de triacilglicerol (forma pela qual a gordura é armazenada no organismo para fins de reserva alimentar).
  • Também responsável pela síntese de proteínas.

A insulina apresenta funções importantes de regulação dos níveis de glicose (açúcar) sanguínea e isso é vital pois níveis elevados de glicose sanguínea podem ser tóxicos para o organismo. Dessa forma toda vez que os níveis de glicose se elevam, a insulina é acionada para reduzir essa quantidade, a glicose em excesso será levada para célula muscular onde será usada como fonte de energia ou armazenada. Mas também irá para célula adiposa onde será armazenada. No momento não cabe uma discussão aprofundada dos processos bioquímicos envolvidos, caso alguém queira saber mais sobre isso podem encontrar informações no livro Why We Get Fat do Gary Taubes (6). 

Então, toda vez que houver um excesso de glicose sanguínea e essa glicose não for utilizada com fonte de energia para o metabolismo, como acontece após um refeição rica em CHO (5), essa glicose será convertida em gordura e armazenada na célula adiposa, isto se chama Lipogênese. Uma pessoa que tiver uma alimentação rica em CHO irá estimular a lipogênese e dessa forma aumenta sua quantidade de gordura corporal, ou seja, irá engordar.

Para ai Carlinhos! Tudo está dizendo que se eu tiver uma dieta rica em CHO, como indica a diretriz oficial do Ministério da Saúde eu vou engordar? Sim, eu disse isso mesmo!

Tu deve estar louco! Todos os médicos e nutricionistas falam que o que engorda é comer gordura! Quando comemos gordura ou proteínas (até cerca de 120 g por dia) e vegetais com baixa quantidade de CHO não ocorrem elevações da glicose sanguínea e consequente aumento da insulina levando a lipogênese.  

Para fortalecer esse conceito vamos ver o que a ciência baseada em evidências diz sobre o que é melhor para emagrecer. Podemos dizer que o que for bom para emagrecer também serve para evitar que engordemos.

Vou falar para vocês sobre 15 estudos experimentais comparando dietas com baixa quantidade e gordura (Low Fat [LF]) e dietas com baixa quantidade de CHO (Low Carb [LC]). Todos eles publicados em revistas científicas reconhecidas internacionalmente por todos os médicos e nutricionistas. Em alguns desses trabalhos os grupos de LC ingeriam no máximo 40% de CHO em outros até 40 gramas de CHO. Os grupos de LF ingeriam entre 10-30% das calorias vindas das gorduras. Analisando os resultados dos trabalhos veremos que sempre as dietas LC levaram as pessoas a emagrecer mais do que as dietas LF.

Bem! Estou dizendo que comer muito CHO engorda baseado na fisiologia e bioquímica e também na ciência baseada em evidências.

É importante frisar que em relação a ação dos CHO e aumento da gordura corporal algumas pessoas são mais tolerantes aos CHO do que outras, fazendo com que essas pessoas possam ingerir uma quantidade maior de CHO sem que ganhem gordura corporal. Isso é determinado principalmente pelas questões genéticas e individualidade biológica. 

Além desse fato ligado a gordura corporal, elevados níveis de insulina também estão relacionados com diferentes problemas de saúde (7,8). Um desses problemas é a diabetes (detalhes no link).


Referências:
  1. Cordain L, et al. Plant-animal subsistence ratios and macronutrient energy. Am J Clin Nutr.71:682, 2000.
  2. Carrera-Bastos P, et al. The western diet and lifestyle and disease of civilization. Research Reports in Clinical Cardiology. 2:15–35, 2011.
  3. Prior IA, et al. Cholesterol, coconuts, and diet on Polynesian atolls: a natural experiment: the Pukapuka and Tokelau Island studies. Am J Clin Nutr.34:1552, 1981.
  4. Lindeberg S. et al. Age relations of cardiovascular risk factors in a traditional Melanesian society: the Kitava. Am J Clin Nutr.66:845, 1997.
  5. McArdle Wd, et al. Fisiologia do Exercício: Nutrição, Energia e Desempenho Humano. Guanabara Kogaan - Rio de Janeiro, 2013.
  6. Taubes G. Why We Get Fat and What To Do About. Anchor Books, New York, 2011.
  7. Taubes G. Good Calories Bad Calories: Fats, Carbs, and The Controversial Science of diet and  Health. Anchor Books, New York, 2008.
  8. William D. Barriga do Trigo: livre-se dos quilos a mais e descubra seu caminha para a saúde. Editora WMF Martins Fortes, 2013.


3 comentários:

  1. Bom dia Carlinhos,
    Conheci tem pouco tempo teu blog, parabéns pelas informações super relevantes.
    Estava dando uma olhada no Guia Alimentar Para a População Brasileira e notei que é de 2006. Fiquei curioso se não haveria algo mais atual, e encontrei a nova edição do Guia, de 2014: http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2014/novembro/05/Guia-Alimentar-para-a-pop-brasiliera-Miolo-PDF-Internet.pdf
    Está mais vaga do que a anterior e não tem mais as diretrizes. Achei interessante como focaram em promover a alimentação com produtos não processados e desaconselham o uso de alimentos processados ou ultra-processados.

    Abraço!

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  2. Olá! Também já li esse texto e com certas observações acho que ele melhorou em relação ao anterior. Caso você queira ler mais sobre o tema acesse o seguinte link http://www.lowcarb-paleo.com.br/2014/11/novo-guia-alimentar-para-populacao.html
    Abraços.

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