quinta-feira, 21 de maio de 2015

Lanche nas Escolas

Em agosto de 2013 o Senado Federal aprovou um projeto de lei que proíbe que as cantinas e lanchonetes instaladas nas escolas comercializem bebidas de baixo teor nutricional [como refrigerantes] e também alimentos com quantidades elevadas de gordura saturada e sódio.

Quando esse projeto de lei foi aprovado outros seis estados [Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso, Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná] e mais onze municípios [Aracaju/SE, Itapetininga/SP, Campo Grande/MS, Florianópolis/SC, Rio de Janeiro/RJ, Ribeirão preto/SP, Belo Horizonte/MG, Pelotas/RS, Natal/RN, Jundiaí/SP e Porto Alegre/RS] também proibiram ou regulamentaram a oferta de alimentos nas escolas.

Em 20 de Janeiro de 2015 o governo da Paraíba proibiu a venda de refrigerantes pelas escolas de rede pública e privada através da Lei N° 10.431. Mais recentemente uma escola de Porto Alegre proibiu a venda de balas [guloseimas] e refrigerantes nas suas dependências [veja aqui].


Uma campanha para que as crianças tenham uma alimentação saudável tanto na escola quanto em casa é extremamente louvável e importante. Nesse caminho o famoso chef de cozinha Jamie Oliver lançou a campanha Food Revolution Day que tem a intenção de lutar pela educação alimentar de todas as crianças.


Todas essas iniciativas possuem grande mérito. Porém alguns pontos importantes precisam ser colocados. Pois com pai o que realmente me preocupa são os fundamentos e conceitos da ciência da saúde e da sociedade que levam a necessidade de proibir determinado tipo de alimento para nossas crianças.


Porque proibir os refrigerantes?

Essa resposta quando fornecida pela maioria das pessoas vai incluir expressões como:
  • Eles têm muito sódio...
  • Refrigerante é puro açúcar...
  • Possuem substâncias cancerígenas...

Açúcar x Saúde

Anteriormente já escrevi sobre os riscos do açúcar para a saúde [veja aqui] em 2013 um importante trabalho [link] demonstrou que 150 calorias de açúcar ingeridas por dia, aumentam o risco de diabetes em 10%. Isso significa ingerir 37,5 gramas de açúcar por dia, mais ou menos 7 colheres de chá!

O motivo pelo qual a ingestão elevada de açúcar é um risco para nossa saúde é que ele altera o metabolismo de um hormônio chamado Insulina, levando a um fenômeno denominado de resistência a insulina. Essa alteração faz com que a insulina produzida no pâncreas não consiga diminuir eficientemente o nível de glicose sanguínea que tenha se elevado, por exemplo, após uma refeição. Isso acontece, pois os receptores de insulina das células apresentam uma falha no reconhecimento deste hormônio. Esse aumento da resistência à insulina acontece quando o corpo fica exposto frequentemente a elevados níveis desse hormônio, gerados por repetidas elevações da glicose que são decorrência de uma dieta rica em alimentos como faz o açúcar.


Atualmente acredita-se que a resistência à insulina seja um ponto importante em diversas patologias, além do diabetes. Para saber um pouco mais sobre esse tema, sugiro que vocês leiam uma postagem anterior chamada “E se medicina estiver olhando para o lado errado” e também clique aqui e aqui.

Outra questão importante sobre o açúcar é que ele é uma substância viciante, como a cocaína e outras drogas, se você quiser entender por que clique aqui, aqui e aqui.

Dessa forma posso dizer que se justifica a intenção de proibir da venda dos refrigerantes nas escolas quando se considera o açúcar. Mas outras bebidas e alimentos possuem tanto ou mais açúcar.

 

Sódio x Saúde

O motivo pelo qual os refrigerantes têm elevadas quantidades de sódio é porque isso faz com que você tenha sede ao tomar um refrigerante e assim você vai beber mais um e mais um e continuar com sede. É dessa forma que a indústria aumenta as vendas. E na realidade o problema do sódio no refrigerante é que ele vai fazer você ingerir mais açúcar.


Os riscos de uma pessoa vir a ter problemas de hipertensão com a ingestão de sódio é muito reduzido, principalmente se a alimentação for baseada em alimentos de verdade rica em nutrientes, gorduras naturais e proteínas e reduzida em alimentos processados e carboidratos. Se você quer entender por qual motivo o sódio não é o vilão que muitas pessoas dizem ser clique aqui.

Em Janeiro de 2015 foi publicado um trabalho [link] chamado “The wrong white crystals: not salt but sugar as aetiological in hypertension and cardiometabolic disease”, que chegou as seguintes conclusões sobre o sal e o sódio na dieta:

O que já se sabe sobre este assunto?
  • A doença cardiovascular é a principal causa de mortalidade prematura no mundo desenvolvido, e hipertensão é o seu fator de risco mais importante.
  • Controlar a hipertensão é um dos principais focos das iniciativas de saúde pública, e abordagens dietéticas historicamente focadas no sódio.

O que pode este estudo acrescentar?
  • As fontes predominantes de sódio na dieta, alimentos processados, geralmente também possuem elevados níveis de açúcares, cujo consumo pode estar diretamente relacionado com hipertensão e riscos cardio metabólicos.

Que impacto este trabalho gera na prática clínica?
  • Os médicos devem mudar o foco do sal e concentrar maior atenção ao açúcar.
  • Uma redução na ingestão de açúcares adicionados, particularmente frutose, e especificamente nas quantidades nos alimentos industrializados, ajudaria não só na redução das taxas de hipertensão, mas também poderia ajudar a resolver problemas mais amplos relacionados com as doenças cardíacas e metabólicas.

As crianças e nós não devemos tomar refrigerantes porque eles têm sódio. Tendo mais sódio eles geram sede. E assim ingerimos grandes quantidades de açúcar e isso irá gerar hipertensão e outros problemas.


Substâncias Cancerígenas

A indústria de bebidas e alimentos utiliza os corantes para conferir, intensificar ou restaurar a coloração dos seus produtos. Isso proporciona não só uma aparência mais convidativa, sob o ponto de vista sensorial, mas também é de suma importância sob o ponto de vista tecnológico, para garantir a uniformidade do produto. O mercado mundial de corantes movimenta anualmente cerca de U$ 950 milhões. Esta situação se deve principalmente, pela sua utilização nas indústrias de refrigerantes do “tipo cola” sendo que no Brasil também participa na formulação dos refrigerantes, sabor guaraná, maçã, abacaxi, tutti-frutti, assim como em bebidas alcoólicas. Em volume de produção, o consumo mundial de corante caramelo ultrapassa 200.000 toneladas/ano e responde por mais de 80% (em peso) de todos os corantes adicionados em alimentos e bebidas [link].

Isso parece comida?!

Existe nos refrigerantes e outras bebidas uma substância chamada de Corante Caramelo IV [4-metilimizadol] que é uma molécula que se forma durante o processo de aquecimento e caramelização. Nos USA [na Califórnia] essa substância é considerada cancerígena desde 2012. Essa decisão pode ser justificada pelas conclusões de um trabalho que demonstrou o potencial cancerígeno do Corante Caramelo IV em ratos [link]. Um trabalho publicado em 2015 [link] demonstrou que alterações na legislação Americana foram efetivas para a redução da quantidade de substâncias cancerígenas existente nos refrigerantes.


Infelizmente o Brasil é o país em que é permitida a maior quantidade, são 267 microgramas  [mcg] a cada 355 ml de bebida. Em segundo e terceiro lugar estão o Quênia e o Canadá, respectivamente, com 177 mcg e 160 mcg.

É claro que estudos em animais não podem nos levar a conclusão que essa substância possa realmente causar câncer em humanos. Mas o “simples” fato de os refrigerantes terem açúcar já é motivo suficiente para não tomarmos, o risco de câncer é simplesmente a “cereja do bolo”.

Outros alimentos podem gerar alterações semelhantes as gerada pelo açúcar?

O açúcar está associado com diabetes, obesidade, câncer e outras doenças. Essa associação ocorre porque ele gera [após a ingestão] uma elevação da glicose sanguínea e consequente aumento dos níveis de insulina. Como dito anteriormente, se sua dieta for rica em açúcar, sua insulina se manterá elevada por maiores períodos. Com o passar do tempo você terá que secretar mais e mais insulina para diminuir os níveis de glicose após as refeições. E essa desregulação da insulina poderá levar a uma série de problemas de saúde.

Acontece que elevações dos níveis de glicose no sangue após as refeições também ocorrem com outros alimentos. Todos os alimentos que contêm carboidratos tem esse potencial, alguns mais outros menos. Os alimentos ricos em amidos e aqueles feitos com grãos, como os pães [branco ou integral], são os que possuem maior capacidade de elevação da glicose. Aquelas bolachinhas integrais, as bolachinhas recheadas, as barras de cereais, os salgados fritos ou assados, cereais em pacote, granola e algumas frutas ricas em carboidratos também irão desencadear as alterações já citadas.


Sim! A insulina tem um lado prejudicial, ela engorda, ela gera inflamação e diabetes. Mas apesar de isso ser verdade, a insulina está longe de ser um hormônio que existe para nos sacanear. Antes pelo contrário. Os problemas surgem quando ela não funciona devidamente, o que infelizmente é bem comum hoje em dia devido aos equívocos do que considera uma alimentação saudável. Equívocos que levam ao que chamamos resistência à insulina. Quando tudo funciona bem, algumas das suas ações são:
  • A promoção da saciedade;
  • O gasto de mais energia;
  • Formação da massa muscular.

A proibição de alimentos ricos em gorduras saturadas faz sentido?

Sobre esse tema já escrevi diferentes vezes [e outros autores também]. Vou resumir e dizer que não existe justificativa científica para que uma pessoa não coma a gordura natural dos alimentos, inclusive a saturada. Com exceção das gorduras trans e dos óleos vegetais ricos em ômega-6, todas as outras gorduras [da picanha, da costela, do coco, do abacate e do azeite de oliva] são fundamentais para uma dieta saudável. E devem ser ingeridas em quantidade maiores as recomendações tradicionais indicam. Para entender mais sobre isso clique aqui e aqui.


O que realmente vai fazer diferença para a saúde das nossas crianças hoje a amanhã?

Essa resposta é simples! Fazer com que elas tenham uma alimentação baseada em comida da verdade, ingerindo gordura natural dos alimentos sem medo, reduzindo a ingestão de carboidratos e também de produtos processados.

Também é importante frisar que os grãos integrais ou não, podem na realidade não serem tão saudáveis quanto muitos imaginam. Para entender isso clique aqui e tire suas conclusões.

Para finalizar, somente proibir refrigerantes ou balas não será suficiente para que o lanche de nossas crianças seja saudável. O problema somente será resolvido quando os profissionais da saúde começarem a usar uma abordagem evolutiva e a ciência baseada em evidências para acabar com os mitos criados sobre alimentação.


A solução realmente efetiva é educação alimentar para as crianças, para os pais, para os professores e para todos. Isso realmente irá fazer diferença!

Carlinhos

treinamentocarlinhos@gmail.com

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